Fluxo do Acolhimento Institucional
O Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) em seu artigo 101º determina a aplicação das medidas de proteção, quando alguma criança ou adolescente sofrer violação de seus direitos, tanto por ação ou omissão da sociedade, estado, pais ou responsável. O ECA estabelece medidas protetivas que incluem não somente a criança, mas a sua família (orientação, apoio e acompanhamento temporários, inclusão em programas comunitários de auxílio à família, tratamentos, entre outros). E como medida excepcional e provisória, estabelece o abrigo. O artigo 101º do ECA (1990) estabelece que diante das hipóteses previstas no artigo 98º, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
- Encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;
- Orientação, apoio e acompanhamento temporários;
- Matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;
- Inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;
- Requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;
- Inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
- Abrigo em entidade;
- Colocação em família substituta. Parágrafo único: O abrigo é medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade.
No ato de acolhimento a equipe técnica realizará os procedimentos – (Art. 6 ECA):
- Acolhida afetiva;
- Abertura de pasta/física e virtual individual, descrevendo os pertences, documentos pessoais, condições gerais de saúde física, observando sinais de violência;
III. Arquivar na pasta individual da criança, cópia dos documentos pessoais e demais documentos e relatórios, guardar seus pertences pessoais;
- Apresentação da criança para equipe técnica, educadores sociais e auxiliares, demais acolhidos, ambiente físico e rotinas;
- Apresentação dos Direitos e Deveres;
VII. Realização da interação com os demais acolhidos;
VIII. No caso de verificação da necessidade de atendimento médico urgente deverá ser encaminhado de imediato. Os demais casos serão agendados os acompanhamentos médicos necessários.
Toda criança e adolescente acolhidos deverão estar acompanhados dos seguintes documentos (Art. 8º):
A Guia de acolhimento expedida pela Vara da Infância e Juventude ou o Relatório do Conselho Tutelar;
- Certidão de nascimento (caso a criança não tenha, deve-se solicitar ao Conselho Tutelar que requisite a certidão ou 2º via da mesma);
- RG, CPF, Cartão SUS e Cartão de Vacinação (caso não tenha, a equipe técnica providenciará a emissão);
- Estudo Diagnóstico Prévio (relatório) elaborado pelo Conselho Tutelar, quando da institucionalização por esse órgão;
- Equipe técnica deverá elaborar o Diagnóstico pós-acolhimento;
- Transferência escolar (caso não tenha, solicitar que o Conselho Tutelar requisite ou a própria equipe técnica poderá solicitar);
- Diligenciar no sentido do restabelecimento e da preservação dos vínculos familiares.
Após a solicitação de acolhimento feita pelo Conselho Tutelar ao Ministério Público, é feita uma apreciação e encaminhamento ao Poder Judiciário, que pode decidir pelo acolhimento ou não. Quando é definido que o acolhimento deve ser realizado, a retirada da criança e do adolescente da sua casa é feita pelo conselheiro tutelar (sabe-se que em alguns casos está sendo feita por oficial de justiça). Há situações de urgência e emergência em que excepcionalmente o Conselho Tutelar também pode efetuar a retirada da criança e seu acolhimento.
Quando a criança ou adolescente é acolhido, deverá a equipe técnica do acolhimento, comunicar ao Poder Judiciário em 24 horas e este, após ouvido o Ministério Público, decidirá sobre seu acolhimento ou não[1].
Toda criança ou adolescente em acolhimento deve ter um auto processual no Poder Judiciário – Vara da Infância e Juventude, sendo que o Ministério Público deve entrar com uma ação de acolhimento institucional, ou de destituição de poder familiar[2] posteriormente, quando for necessário. Há uma circulação destes autos, entre o cartório da infância e juventude, o Ministério Público, o gabinete do juiz, o setor de serviço social e psicologia da Vara da Infância e Juventude. A família pode constituir um advogado para se defender (defensoria pública), pronunciar-se nos autos e manifestar seu posicionamento. Deverão ser cumpridos os despachos do juiz, e dentre eles, pode ser solicitada a realização de estudo social e psicológico do caso pela equipe multidisciplinar do serviço de acolhimento ou equipe da Vara da Infância.
A Lei 12.010 (2009) prevê que toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento terá sua situação reavaliada no máximo a cada 90 dias[3], devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado pela equipe multidisciplinar decidir sobre a situação. Essa medida é extremamente importante, no sentido de garantir um acompanhamento dos casos e evitar o prolongamento da permanência da criança em acolhimento de forma desnecessária.
O artigo 18 do ECA, determinou ainda que é dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento vexatório ou constrangedor. Já o artigo 6º do mesmo diploma legal, enuncia que “na interpretação desta Lei, levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.”
Pois bem, tais dispositivos de natureza eminentemente protetiva são de ordem pública, se sobrepondo a quaisquer outros direitos, e obrigam o Estado (sentido amplo) ao seu cumprimento, independentemente de provocação, não carecendo de medida judicial para que a imagem das crianças e dos adolescentes seja preservada.
Parágrafo Único. O sigilo sobre a história de cada criança e adolescente deve ser absoluto, de acordo com ECA: Art. 17, 18 e 70.
Para a realização das visitas assistidas na instituição, os voluntários terão que apresentar a autorização expedida pela equipe técnica e serão monitoradas por um membro da equipe técnica, Assistente Social e/ou Psicólogo ou por Coordenador responsável.
Para que a Equipe Técnica autorize as visitas assistidas por voluntários, antes deverá entrar em contato com a Equipe de Captação de recursos a qual deve solicitar autorização para a Equipe Técnica do acolhimento Institucional. Em relação ao voluntário que está solicitando visita na instituição, bem como também ouvir a Coordenação do Abrigo acerca de restrições administrativas, e se o parecer técnico for favorável e não houver restrições administrativas, a Equipe Técnica emitirá a autorização para a visita assistida comunicando o setor de captação de recursos.
Caso haja percepção da equipe técnica de que as visitas ou trabalho dos voluntários, estão prejudicando a estabilidade psicossocial da criança, deverá ser informado ao setor de captação de recursos, solicitando a suspensão do trabalho de voluntariado e a exclusão do mesmo. Cabe mencionar, deve-se garantir o não contato físico de voluntários com as crianças as quais estão sob medida de proteção.
O trabalho voluntario na ACRIDAS dever seguir as seguintes regras:
Conhecer a realidade: antes de começar o trabalho, o voluntário precisa conhecer a complexidade e delicadeza do serviço de acolhimento, entender sua função, como funciona e estar ciente de qual será sua contribuição neste cenário.
- Adoção: o envolvimento a partir de um trabalho voluntário em um serviço de acolhimento não facilita processos de adoção. Se esse for seu interesse, vá até a Vara da Infância e Juventude mais próxima a sua casa e informe-se sobre o processo para entrar no Cadastro Nacional de Adoção.
- Formação e supervisão: é preciso ter clareza de que para realizar um trabalho voluntário é necessário planejar considerando e contemplando tudo o que a entrada no serviço pode reverberar. Profissionais da área devem apoiar a ação do início ao fim.
- Cuidado com o que fala: o voluntário deve evitar o levantamento de falsas expectativas com as crianças. O Voluntário deve agir à altura de seu papel e, não revitimizar histórias das crianças no ambiente de acolhimento.
Entende-se, que o serviço de acolhimento é um espaço no qual as crianças e os adolescentes sob medida de proteção, devem se sentir protegidos, cuidados, acolhidos e criem vínculos de confiança que favoreçam o seu desenvolvimento integral e a construção de autonomia nesse período de transição provisória. Estabilidade e tempo de convivência são indispensáveis para que se criem os tão necessários vínculos afetivos.
Por – Izabela Freitas Fonseca – Assistente Social, Especialista em Psicologia Jurídica, coordenadora da Equipe técnica ACRIDAS.
Referências
- ESTATUTO da Criança e do Adolescente, Lei Federal n. 8.069 de 1990.
- POLÍTICAS e prioridades políticas. Revista Fórum D. C. A., n. 1, 1993.
- Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária – CONANDA/2009.
- Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes – CNAS/ CONANDA/2009.
- https://www.fazendohistoria.org.br/blog-geral/2017/3/3/trabalho-voluntrio-em-servios-de-acolhimento-mais-ajuda-quem-transforma – consulta em 16/09/2020.
[1] Conforme o artigo 93 da Lei 12010 (2009) o serviço de acolhimento tem o prazo de 24 horas para comunicar ao Poder Judiciário sobre o acolhimento realizado em caráter de urgência.
[2] Também para diminuir o prazo, a nova lei reduziu à metade o tempo do Ministério Público para ingressar com ação de destituição do poder familiar nos casos em que for constatada a impossibilidade de reintegração da criança ou do adolescente à família de origem. De 30 dias, o prazo caiu para 15 dias, salvo se se entender que são necessários estudos complementares ou outras providências indispensáveis ao ajuizamento da demanda, como consta no artigo 101, parágrafo 10, do ECA.
[3] Em relação ao problema dos prazos, a Lei 13.509, sancionada em 22 de novembro de 2017, surgiu para defini-los, muitas vezes encurtá-los e, consequentemente, agilizar o processo de adoção. Essa lei alterou o ECA, que agora no seu artigo 19-A, parágrafo 3º, estabelece um prazo, que antes não existia, para a busca da família extensa: noventa dias, prorrogável por igual período.